terça-feira, 16 de março de 2010

Nós enquanto palhaços acidentais



Volta e meia, passamos por aqueles momentos em que nos sentimos muito mal, por termos deixado que alguém nos fizesse de bobo. Isso pode acontecer quando você atende à súplica de alguém que precisava de dinheiro, e terminou sendo o endividado, porque a pessoa nem pagou, e nem deu satisfação. Pode também ser fruto de uma pessoa em quem você confiava e te passou para trás sem a menor cerimônia. Outro caso comum é o de quando você compra a briga de alguém, as duas partes terminam conciliadas, e você fica com a maior cara de pateta do mundo. Traição de namorado(a), troco errado recebido na padaria, propaganda enganosa, hora-extra que não é creditada...enfim, existe uma infinidade de possibilidades, sozinhas ou combinadas entre si, de situações onde você não sabe se tem mais raiva de si, ou da pessoa que causou aquele transtorno. Difícil disfarçar aquele imenso nariz vermelho na rua, mas, do espelho então, é impossível.

Hoje, foi assim que me senti. Por recomendação médica, e em caráter de urgência, adquirimos uma esteira ergométrica pelo site de vendas do Submarino. Todas eram um bocado caras, mas encontramos uma que, por mil reais, faria a função básica exigida pelo cardiologista. Conversa daqui e dali, resolvemos investir na compra, por mais que fosse doer no bolso pelos próximos meses.

Dois dias úteis depois do pedido, chegou nossa encomenda. Abrimos com todo cuidado, aparato familiar total, foi montada com todo carinho, instruções lidas e então percebemos que exigia voltagem de 220V. Bom, não temos tomadas de 220V em casa, nem sequer no prédio, portanto, esperei até o dia seguinte, e fui à Barra da Tijuca desembolsar mais R$100,00 em um transformador de voltagem. Não havia mais o que errar. Era chegar em casa, plugar no transformador, plugar na tomada e pronto: esteira funcionando. Bom, até o “pronto”, tudo foi feito exatamente assim...só que a esteira não funcionou.

Fiquei chateadíssima, frustrada, especialmente pela necessidade dos exercícios e pelo dinheiro desembolsado, mas, não me restou alternativa senão mandar um e-mail para o site Submarino, de onde ele foi comprado, avisando sobre a necessidade da troca da esteira quebrada por um outra. Simples assim.

Acidentes acontecem, todos nós sabemos. Ninguém (nem o maior dos fabricantes ou revendedores de produtos) está livre de comercializar algo que acabou se provando defeituoso. Esperar que isso jamais aconteça é irracional. Porém, a grande diferença entre os bem e mal intencionados reside no que acontece depois disso.

Não tem nem duas semanas, aluguei uma bolsa na Bobags (já citei a loja aqui, no artigo “Ode aos pequenos luxos”), que, quando usava no dia seguinte, se estabacou no chão, devido a alça arrebentada. Fiquei chateada, claro, até porque, não gosto muito de catar objetos pessoais em frente ao caixa eletrônico de um shopping, Porém, assim que cheguei, enviei um e-mail para eles expondo o ocorrido, e, na mesma hora, me foi oferecido trocar aquela bolsa pelo aluguel de qualquer outra, ainda que de valor muito maior. Eles levaram minha escolhida no dia seguinte, e deixaram comigo até além do prazo estipulado, além de mandarem vários pedidos de desculpas, visivelmente sinceros. O que fica, nesse caso, não é a impressão da bolsa que arrebentou, e sim, da seriedade, respeito e preocupação da loja e das pessoas que trabalham lá. Independente do acidente, é claro que alugaria produtos lá novamente. Eles se mostraram aptos a lidar com o serviço, e com os acidentes de percurso.

Já ontem, recebi a resposta do Submarino, dizendo que minha esteira avariada seria apanhada no dia 29/03, e que uma outra esteira seria entregue após a análise da anterior, análise de estoque, e só então, enviada para mim. Eles, sequer, souberam dar um prazo! Quando expliquei a questão médica, e do quanto a demora seria excessiva, uma vez que precisamos da esteira o quanto antes, recebi uma resposta reafirmando o prazo anterior, e dizendo que, se ao invés de trocar eu quisesse devolução, os prazos seriam os mesmos. Leia-se: “nós não nos importamos. Você foi prejudicada, e só você arcará com isso”.

Fiquei tão indignada com essa falta de respeito, de satisfação (sequer foi enviado um pedido de desculpas pelo transtorno que pode ter gravíssimas conseqüências)e de humanidade que, além de querer sim devolver de vez esse produto, e encerrar qualquer vínculo com esse site, mandei a resposta para eles em cópia para vários dos meus amigos, e vou correr atrás de meus direitos enquanto consumidora.

Com isso, não quis só evitar que pessoas queridas venham a sofrer o mesmo transtorno, mas também mostrar que juntos, temos algum poder sim, de influenciar o modo como as coisas vêm sendo conduzidas. Um que é feito de bobo e se envergonha disso, é apenas um número que favorece a irresponsabilidade e má-fé dos comerciantes e prestadores de serviços ruins. Já um picadeiro inteiro de palhaços acidentais, que se conscientizam de que quem precisa ter vergonha é o lado oposto, e se unem para mudar essa história, tem todas as chances de sucesso.

É inútil buscarmos pela raspa de honestidade e respeito que alguns órgãos e pessoas possam vir a apresentar. A capacidade de surpreender com as reações aos erros não encontra limites. Porém, nossa tolerância sim, encontra. Cheguei à minha capacidade máxima de deixar para lá. Se não estamos confortáveis com essa maquiagem, sapatos bicudos e nariz vermelho, então, porque continuamos a dançar conforme a música tocada nesse circo?

O Bozo que me desculpe, mas EU não faço mais parte desse time.

quarta-feira, 10 de março de 2010

O "EU" olfativo


Um dos últimos comentários que recebi no polêmico post "Ode aos pequenos luxos", me trouxe para o aparentemente raso tema desta postagem. A Dani me pediu dicas para superar uma perda aparentemente simples, mas que esconde uma gravidade inerente: a do perfume de estimação. Ela me dizia não conseguir arrumar um sucessor para sua fragrância preferida, que deixou de ser comercializada no Brasil.

Entendi o drama da Dani na hora! Pode parecer a coisa mais tola do mundo, mas o julgamento é precipitado. Só quem viveu a situação de se ver viúva do perfume ao qual foi fiel por muitos anos, sabe o desespero que isso dá.

Vivi uma situação parecida quando meu amado perfume, pelo qual me apaixonei aos treze anos de idade, e usei de forma fiel e exclusiva, foi tirado do mercado depois de 12 anos de amor eterno. Quando você encontra o perfume perfeito, se sente incrível e segura como quando encontra seu príncipe encantado. Por essas e outras, a notícia de que tinham parado de fabricar minha fragrância secreta foi um golpe do qual demorei muito a me recuperar. Foram muitos meses de tentativa e erro.

Se traduzir em cheiro não é fácil. Os cheiros carregam impressões, características, lembranças, sensações. Alguns cheiros que passam por mim na rua, são capazes de me carregar, subitamente, por uma montanha russa de emoções. Basta ser pega de surpresa por um determinado cheiro e lá estou eu, transportada via nasal para uma circunstância tão específica e clara, que nem se eu fosse hipnotizada, teria alcançado tão concretamente.

Por saber o quanto o cheiro pode ser marcante, o cuidado com escolher o meu torna-se redobrado. Não pode ser algo gostosinho, porém sem qualquer personalidade, nem algo que me pareça transmitir uma imagem que não se identifique com a minha, nem algo que fique bom na pele dos outros, mas não na minha. Comprar perfume igual ao de alguém conhecido então, para mim é traição que merece punições severas! O cheiro é uma marca registrada. Já viu marca registrada compartilhada?

E foi assim que vaguei, durante meses, consolada pelo excelente cheiro de alguns shampoos, hidratantes, finalizadores, creme para as mãos, e até batons...mas sem perfume! Já estava tão acostumada com meu luto, que fui deixando de procurar até me esquecer de vez dessa missão.

E foi então que, em uma bela tarde andando por Buenos Aires, fui atacada por aquelas vendedoras de perfumaria, que ficam de tocaia na porta de suas lojas, esperando uma pobre vítima distraída para borrifar as mais diversas fragrâncias de forma tão invasiva, que você passa segundos de terror imaginando se é um ataque terrorista, lança-perfume, spray de pimenta ou um genérico ultrapotente de Sorine. Para minha surpresa, a nuvem que me envolveu não era digna de fuga e rolamento. Era um cheiro ótimo, que me cativou pelos dois dias seguintes, em que ficou impregando (no uso positivo do adjetivo) no meu casaco. Resultado, me permiti um novo casamento, e comprei aquele novo perfume. Mais de um ano depois do episódio, estou no meu terceiro vidro, e cada dia mais feliz por ter encontrado o meu "EU" olfativo novamente!

Se eu tivesse um conselho, seria esse: lide com a questão do perfume como se estivesse lidando com o grande amor da sua vida. Não se deve colecionar, cobiçar o alheio, recomendar que compartilhem do seu, se conformar com algum que não seja exatamente o que você procura, nem seguir adiante com algum que não te faça feliz. Não tenha pressa e nem vergonha de travar uma busca inexorável. No entanto, lembre-se que, mais do que procurar, você deve estar apta a reconhecer quando estiver diante dele (o que fatalmente acontece, não se preocupe). E, quando encontrar...não deixe escapar por nada nesse mundo, mesmo que seja necessário investir pesado na relação.

E, se amanhã, ele sair da sua vida por qualquer motivo que seja, terá valido a pena mesmo assim. Afinal, não é necessário que seja eterno, contanto que seja imortal enquanto dure.